Müsteiro
Chuva em Novembro, Natal em Dezembro.
4.11.05
Na minha modesta opinião (que, como todas as opiniões, vale o que vale), um álbum de música pode-se enquadrar em 4 categorias distintas: os álbuns bons, onde a maioria das músicas até têm uma qualidade acima da média e a sua audição se torna enriquecedora; os álbuns fracos, dos quais apenas se destaca um ou outro tema, ficando os outros votados a uma entediante monotonia; os álbuns marcantes, que são aqueles que causam um tal impacto que influenciam as gerações seguintes, dando origem a um som ou estilo facilmente reconhecível, que inspira bandas e fãs. Apenas passado bastantes anos é possível classificar um álbum nesta categoria, pois nunca sabemos se as próximas correntes musicais vão seguir os trilhos marcados pelas bandas anteriores. Os exemplos de álbuns marcantes são inúmeros: o "Back In Black" dos AC/DC, os 6 ou 7 primeiros álbuns de Led Zeppelin, o "Master Of Puppets" dos Metallica, o "In Utero" dos Nirvana, o "Kaos A.D." dos Sepultura ou, para citar um mais recente, o "Toxicity" dos geniais System Of A Down. E, nestes casos, a subjectividade é menor do que se possa pensar...
Os álbuns que se incluem na quarta categoria podem pertencer também em simultâneo à anterior, o que sucede algumas vezes. E a razão porque eu considero que as duas categorias não se fundem é apenas esta: alguns álbuns não podem ser imitados, seguidos e muito menos suplantados, sob pena de se cair no fracasso. A qualidade destes é tanta que quem tentar seguir a mesma fórmula está (quase) condenado a ficar aquém do trabalho original. São álbuns obra-prima.
É nesta categoria que enquadro o mais recente trabalho dos Opeth, "Ghost Reveries". Não se trata de um álbum marcante uma vez que as linhas que definem o som da banda de Estocolmo foram já definidas há muitos álbuns atrás. Porém, é um álbum que condensa e aprimora todo o trabalho que a banda de Mikael Åkerfeldt desenvolveu ao longo dos anos, e o resultado é de uma beleza ímpar.
O sucessor do melancólico "Damnation" (que se caracterizou como uma experiência por territórios quase exclusivamente acústicos e ambientes calmos que, segundo o líder da banda, não terá repetição) traz de volta a força do death metal que foi o som de origem desta banda. Porém, não se assustem os detractores das vocalizações rasgadas e apologistas da melodia - há de tudo neste álbum. Sem abandonar as texturas complexas, os Opeth levam a sua força criativa ao extremo, sempre apoiados nas bases do rock progressivo surgido nos anos 70, sempre inovando, ou alternando a melodia com o poder do seu metal, ou mesclando-os de uma forma genial em temas que, não raras vezes, ultrapassam a dezena de minutos de duração. Para enriquecer musicalmente o trabalho destes suecos, o número de músicos passou para cinco, com a entrada de Per Wiberg para as teclas. Acompanhamentos de piano, ambientes clássicos e góticos criados pelo órgão, funcionam como um bónus neste álbum, e são uma mais-valia na música de Opeth.
O álbum abre com Ghost of Perdition, um tema que dissipa instantaneamente quaisquer dúvidas que pudesse existir quanto à mudança de estilo - vozes guturais/vozes límpidas, guitarras distorcidas/guitarras acústicas, tudo se entrelaça com um resultado final absolutamente imprevisível, tais são as constantes mudanças de ritmo, melodia e voz. As próprias letras parecem neste álbum muito mais esclarecidas: "The incoherent talk of ordinary days / Why would we really need to live? / Decide what is clear and what's within a haze / What you should take and what to give...". Ao terminar dos 10 minutos desta primeira faixa dou por mim a pensar "Mas o que raio é que eles vão fazer mais aqui?", tal o ecletismo desta faixa, bem patente nos últimos 2 minutos da música.
A resposta vem com o segundo tema, The Baying Of The Hounds. Entra a rasgar, como se tívessemos efectivamente uma matilha no nosso encalço. O ritmo das percusões remete-nos para os temas mais acelerados de Camel, uma das bandas de culto e grande influência dos elementos da banda. Torna-se fácil imaginar as hordas metaleiras a agitar as cabeleiras ao ritmo frenético destes riffs, que nunca se mantêm iguais durante muito tempo. O tema culmina com um blastbeat demolidor aos 6' do tema, para depressa regressar à calmaria quase hipnótica das guitarras acústicas. Mais uma vez, 10 minutos que rompem com a tirania usualmente imposta à duração "normal" das músicas. E que sabem a pouco.
O terceiro tema, Beneath The Mire, inicia-se com ambientes mediterrânico-árabes criados pelas guitarras e teclados, paisagens que já tinham sido visitadas no tema Closure do anterior Damnation. Mais uma vez se torna bem patente que, na música de Opeth, nada está pré-definido: não há estereótipos, não há caminhos pré-traçados. Ao escutar estes temas fica a nítida sensação de que estes temas foram ganhando vida nos instrumentos, tal é a naturalidade da evolução da música e das mudanças dentro de cada uma delas.
Atonement é um dos temas de Ghost Reveries que revisita os ambientes atmosféricos e progressivos de Damnation. Numa toada calma, as guitarras vão desfilando, com os teclados a dar o mote para todo o tema. Aos 5:20 de música o piano silencia-se e inicia-se uma espécie de interlúdio à 5ª faixa, Reverie / Harlequin Forest. Guitarras a debitar riffs decididos continuam a fuga da matilha pela floresta de sons, e a voz segura de Mikael Åkerfeldt, mais límpida que nunca, vai narrando a história. Tal evolução nas vocalizações deve-se seguramente aos ensinamentos do produtor Steve Wilson (vocalista de Porcupine Tree), cujo registo vocal se aproxima das partes mais calmas das músicas de Opeth. Mais uma vez juntam num só tema muitas músicas diferentes, usando o seu know-how para fazer com que mesmo as mudanças bruscas do "pesado" para o acústico nos soem perfeitamente enquadradas e lógicas. A partir dos 10 minutos a música entra num riff hipnótico que nos desarma, ocultando o final quase brusco.
A faixa 6, Hours Of Wealth, é o segundo tema do álbum que entra na linha melódica do seu antecessor, e é uma música para a qual o epíteto de fabulosa é escasso. Mais uma vez se nota bem como a banda de Andy Latimer marcou estes rapazes suecos, que juntam aos elementos prograssivos a sua dose de obscuridade, resultando em... Opeth! [Será uma mistura Opera + death= Opeth?] O tema inicia-se com as guitarras acústicas acompanhadas dos teclados, criando um ambiente melancólico e negro, que o piano se encarrega de levar ao extremo. Aos 2:25 de tema, vem a confirmação: a voz de Mikael está em melhor forma do que nunca para transmitir aquilo que deseja, da melhor maneira (por isso é que estou a escrever estas palavras com os pelos completamente eriçados). O tom, de arrepiar. A interpretação, irrepreensível. Os coros, perfeitos. O órgão toma as rédeas do tema na parte cantada e, quando termina com "Once I am sure of my task I will rise Again...", o solo de guitarra dá ao tema a forma de um blues que faria corar de inveja o próprio Gary Moore.
E depois da bonança... vem a tempestade. Tempestade é eufemismo, pois com The Grand Conjuration parece que o próprio céu nos vai desabar sobre a cabeça (sem relação com Astérix). Um riff demolidor entra a rasgar, acompanhado pela bateria frenética, desafiando os compassos com contratempos encadeados. Esta descarga de força depressa dá lugar a um espaço de calma, com a voz quase sussurrada, até que um grito visceral a plenos pulmões nos agarra pelos colarinhos: "The eyes of the devil Fixed on his sinners"!!! Alguns momentos calmos na música não atenuam a força deste tema, o mais pesado de todo o disco, que continua ao longo de 10 minutos a descarregar decibéis com grande intensidade. Contrasta com Isolation Years, a última faixa e a mais curta do álbum, que regressa a uma toada melancólica, em tom de despedida.
Sei que a maioria das pessoas reagirá melhor ao temas acústicos e melancólicos do que aos temas mais pesados. Porém, a fórmula é a mesma. O peso é o mesmo, e é errado confundi-lo com a distorção das guitarras ou com a intensidade das vocalizações. Fechem os olhos e está lá tudo: paisagens nocturnas, personagens com várias caras e travos, histórias de memórias dolorosas, loucuras e desvarios... Tudo num terreno onde o poder, a melancolia e a beleza se conjugam por métodos intrincados.
Se Blackwater Park foi aclamado pela crítica como um álbum fabuloso, que dizer de Ghost Reveries? Mais elaborado, mais melódico, mais pesado, a voz mais segura que nunca, com a adição dos teclados a levar mais longe as possíbilidades dos Opeth... o resultado só podia ser um álbum assim. Se há álbuns nota 10, este merece a nota, com distinção. Vale a pena uma banda aperfeiçoar a sua criação durante anos para alcançar algo assim.
Por o álbum ser tão bom é que, a cada nova audição, esta "crítica" foi sempre reescrita (e por isso demorou tanto a ser concluída). E de certeza que ainda sofrerá alterações...
2 Comments:
Também adoro o Gary Moore, mas... ouve e julga! ;)
ja agr k a tua amiga falou em pirataria... epah conheço montes de gente k é contra isso... ( devem-se axar xeios de $)... a musica n é assim tao barata! bem kanto a crítica... so podia ser ao novo album dos opeth...simplesment lindo... a ver se o gravo todo...fika pra kalker dia...
tu até que escreves bem ...tas na frente gajuh xD
kixxes
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