Müsteiro

Chuva em Novembro, Natal em Dezembro.

19.2.10

2009

Foi um ano que não apetece muito recapitular. Se, a nível pessoal, foi um ano com grandes momentos, a nível social enquadrou-se num momento amargo, que tem continuidade nestes primeiros momentos de 2010. Felizmente, conseguimos desvanecer as sombras de tristezas quando nos agarramos aos nossos anti-depressivos do dia-a-dia. Cada um tem os seus. Eu mantenho-me fiel à "droga dos ouvidos". Já é mais que vício, é quase uma dependência. Saudável, felizmente.
Muita música de qualidade surgiu no ano de 2009. Não me sinto capaz de elaborar uma lista dos "melhores do ano", pois actualmente a quantidade e a qualidade são tantas que me é impossível conseguir ouvir tanta música boa que anda por aí. Ainda assim, aqui ficam o que de melhor ouvi em 2009:

Porcupine Tree - "The Incident"

Porcupine Tree - The IncidentA banda do mestre Steve Wilson está de volta e, como já é apanágio nestes rapazes, não deixa nada ao acaso. Este álbum é tudo menos um incidente, sendo tão apenas uma das obras mais sólidas destes britânicos. Tendo em conta o historial que têm, é dizer muito.
Este trabalho duplo tem um pouco de tudo o que já fizeram, mas melhor. Steve Wilson continua a fazer desfilar os seus personagens perturbados, dando uma visão quase psicanalítica dos seus comportamentos, que podem ir da mais inocente criança que brinca frente à sua casa até ao sociopata que se enclausura em casa. E são-nos apresentados de uma forma tão despojada que acabamos por nos identificar com cada um deles.
O álbum tem momentos perturbadores que podiam ter saído do "In Absentia", intercalados com temas mais "arejados" que encaixariam perfeitamente no "Lightbulb Sun" ou no "Deadwing", passando por variados momentos onde esta dualidade conhece uma alternância constante, como se passava no "Fear Of A Blank Planet".
Por entre a urgência de "Drawing The Line", a inocência de "Time Flies" e balanço do tema-título, o álbum flui como se de uma só música se tratasse. E quando uma banda consegue que mais de uma hora de música passe num instante e de forma tão agradável como apaixonante, pouco mais há a dizer. "The Incident" é um álbum não só para quem já é fã, mas também para quem irá ser.
Contando com um compositor como Steven Wilson, os Porcupine Tree são inquestionavelmente uma das melhores bandas da actualidade. E já nem falo do espectro do rock progressivo, pois esse campo já eles dominam há muito. Mas não se limitam a isso, e são muito, muito mais.

(Os Porcupine Tree deram, no final de 2009, dois concertos em Portugal, nos quais interpretaram está álbum na íntegra, deixando perceber ainda melhor a grandiosidade deste trabalho. A precisão e seriedade britânicas que fazem parte da sua personalidade não impediram e até contribuíram para que os fãs presentes saíssem do espectáculo de peito cheio. A repetir.)

Long Distance Calling - "Avoid The Light"

Long Distance Calling - Avoid The LightDepois do sucesso dos Pelican, várias bandas surgiram a explorar o pós-rock instrumental. Redondos falhanços, na sua maioria. Para além da muita oferta que existe actualmente, como referi no início do post, fazer música instrumental implica saber compensar a ausência da parte vocal de forma adequada. E pode-se dizer que é aí que reside o maior trunfo dos Long Distance Calling.
Dos
seis temas que constituem este álbum, cinco são totalmente instrumentais. Os temas são longos, mas longe de serem aborrecidos. A prova disso é que, na primeira audição, só nos apercebemos da ausência de voz quando o mestre Jonas Renkse (Katatonia) se faz ouvir em "The Nearing Grave". Ironicamente, esta participação especial acaba por ser a única mossa neste trabalho brilhante, já que destoa do tom geral do álbum, soando perfeitamente vulgar e demasiado colado ao som da banda sueca.
É inevitável abanar a cabeça ao som dos temas de "Avoid The Light", seja-se ou não fã do género. Riffs repetitivos, arranjos de guitarra sublimes, melodias em crescendo, variações tão subtis quanto surpreendentes, tudo isto resulta em temas épicos.
Em suma, um álbum altamente recomendado, e uma banda a seguir.

Bizarra Locomotiva - "Álbum Negro"

Bizarra Locomotiva- Álbum NegroO maior mistério em relação a esta já de si misteriosa banda é simples: como é que, ao fim de mais de década e meia de proveitosa labuta, há por aí gente que ainda não chocou de frente com esta locomotiva? O nome maior do industrial nacional lança mais um álbum de originais para suceder "Ódio". Se o anterior trabalho era bom, mas não passava disso, este acerta onde seu antecessor falhou. Para quem já conhece, não espere surpresas, terá antes confirmações. Predominam os sons maquinais, a electrónica minimalista, os ritmos compassados, e sempre acompanhados da voz gutural do enorme (literalmente) Rui Sidónio. As letras a fazer lembrar Mão Morta encaixam na perfeição neste quadro, que não é belo, antes sujo, duro e frontal.
O dueto com Fernando Ribeiro (Moonspell) em "O Anjo Exilado" é um dos pontos altos do álbum, onde os dois vocalistas nos arrebatam, gritando a plenos pulmões "Renego, renego tudo, renego mais que tudo!". Destaque também para temas como "Egodescentralizado", "Sufoco de Vénus", "O Grito", e o mais lento e arrastado "Ergástulo".
Um grande álbum, de uma banda marcante da música portuguesa, que já merecia um maior reconhecimento. Para quem julga que industrial é Rammstein, recomendo que assistam a um espectáculo de Bizarra ao vivo, onde eles são verdadeiramente brilhantes. Esta música só faz sentido num palco.

Mastodon - "Crack The Skye"

Mastodon - Crack The SkyeO regresso dos Mastodon faz-se com mais um álbum marcante. Como se "Leviathan" e "Blood Mountain" não tivessem já agitado suficientemente as águas do metal progressivo, eles voltam à carga com "Crack The Skye", que se pode dizer que é o seu álbum menos agressivo. O tema de abertura, "Oblivion", dá o mote para o que encontraremos no resto do álbum: grandes doses de brilhantismo, composições nada estanques, enfim, temas carregados de génio. A base sludge/stoner que sempre fez parte dos Mastodon continua lá, mas agora os ingredientes que eles ambiciosamente adicionaram à sua música são tantos que se torna difícil descrevê-los. Podiam facilmente ter continuado a ter sucesso limitando-se a utilizar os breaks esquizofrénicos e as linhas de guitarra alucinantes que nos assaltam em "Leviathan" (e, se o fizessem, é bem possível que falasse aqui deles na mesma, porque eles têm qualidade de qualquer forma), mas optaram pelo caminho menos óbvio, e ainda bem. Há muita coisa a passar-se simultaneamente neste álbum, pelo que requer bem mais que uma ou duas audições, mas é essa descoberta que o torna fascinante. Estas músicas carregadas de tempos e estruturas em constante mutação conseguem, por impossível que isso pareça, um equilíbrio perfeito entre a exploração e inconformismo do progressivo e o peso das suas origens, com um resultado que se aproxima da perfeição.
O baterista Bränn Dailor está mais contido nas suas intervenções, sem que isso afecte a sua performance. As vocalizações continuam a ser o único aspecto onde os Mastodon não demonstram virtuosismo. Troy Sanders e Brent Hinds não têm um grande aparelho vocal, (por vezes soam como o Ozzy) mas o seu timbre e sonoridade são já parte do som que é reconhecido como sendo específico desta banda.
Depois de terem sido considerados uma das bandas mais originais e criativas dos últimos tempos (eles escreveram um álbum inteiro baseado no "Moby Dick, que diabo!) com "Leviathan" e "Blood Mountain", os Mastodon continuam a desbravar terreno e a conseguir surpreender. Até quando? Esperamos ansiosamente para saber. Mas é com bandas destas que se escreve a história da música.

Beardfish - "Destined Solitaire"

Beardfish - Destined SolitaireO que os Beardfish trazem é art-rock, genuíno. Logo, não é aconselhável a quem não tem paciência para as quantidades de informação que um álbum deste género musical aporta. Quem não aprecia bandas como Marillion, Transatlantic, Spock's Beard, The Flower Kings, The Tangent ou Frost*, certamente também não será grande fã do que se faz neste álbum. Apesar disso, merece a tentativa, porque este álbum surpreende. Poucas vezes se encontra um álbum que consegue conjugar de forma tão perfeita a modernidade dos recursos do presente com o melhor da criatividade psicadélica dos anos 70. Mas o "Destined Solitaire" não se resume a isto. A versatilidade dos Beardfish parece não conhecer limites, pelo que saltam de estilo em estilo de tal forma que parece que a única regra que seguem é que as músicas têm que soar perfeitas.
Ao ouvir o caldeirão de influências que é este álbum, damos de caras com o "Nursery Crime" dos Genesis, passamos pelo "Fragile" dos Yes, e somos visitados pelo "In Rock" dos Deep Purple (entre outros), com a diferença de tudo nos soar a novo. Conseguem entrar pela experimentação quase jazzística, à mestre Zappa, ao mesmo tempo que nos atiram refrões orelhudos que ficam na cabeça durante dias a fio. Intrincado e "catchy" ao mesmo tempo.
O tema título é uma criação fulcral neste álbum, mas é no "Until You Comply" que os Beardfish conseguem o seu melhor momento, num tema de 15 minutos que não nos larga do princípio ao fim. Mais para a frente recebemos a lufada de ar fresco que é "Coup de Grace", onde o som do acordeão traz um ritmo de tango sem fugir ao ritmo progressivo do álbum, que encerra com um tema mais eléctrico cujo título resume bem este trabalho dos Beardfish: "The Stuff That Dreams Are Made Of". Venham mais sonhos destes.


Katatonia - "Night Is The New Day"
Um álbum destes suecos é sempre um momento assinalável. Depois do excelente "The Great Cold Distance", a fasquia estava bem alta. Com este álbum, não se pode dizer que a tenham superado. Mas certamente não a baixaram ou defraudaram as expectativas.
É sempre um prazer escutar o tom cálido de Jonas Renkse neste excelente trabalho, e a composição dos temas mantém o nível a que nos habituaram. Três anos depois, os Katatonia presenteiam-nos com um trabalho de grande nível, e demonstram porque há muitas personalidades na esfera do metal que os considera das melhores bandas do género.



Alice in Chains - "Black Gives Way To Blue"
E aí estão eles! Depois de nos terem mostrado no SBSR que estavam bem e de saúde, eis que os pupilos de Jerry Cantrell vêm confirmá-lo com este álbum. A substituição do falecido Layne Staley pelo mais "alegre" William DuVall não beliscou nem um pouco o feeling
transmitido pela banda. Voltaram às origens, não seguiram modas, e trouxeram-nos de volta os velhos Alice In Chains. Foi como se nunca tivessem estado ausentes!


Riverside - "Anno Domini High Definition"
Estes polacos são provavelmente um dos segredos (injustamente) mais bem guardados do rock europeu. Depois de lançarem o soberbo "Rapid Eye Movement", onde exploraram territórios que iam desde uns Tool a uns Pain Of Salvation, passando pelos obrigatórios Porcupine Tree, os riverside lançam agora um álbum menos fácil de digerir, mas ainda mais recompensador para o ouvinte que lhe dá uma oportunidade. Mais que uma banda a seguir, os Riverside são uma banda a reter e acarinhar!


Trail Of Tears - "Bloodstained Endurance"
Ora aqui está uma banda da qual já ninguém esperava notícias. Depois do muito promissor "Disclosure In Red", os seus trabalhos seguintes foram "engolidos" na avalanche de clichés que se tornaram a maioria das bandas de inspiração gótica com vocalista feminina. Mas regressaram em força, com um álbum fortíssimo, cheio de personalidade, e que nada tem de lamechas. Dá gosto ouvir este "Bloodstained Endurance", título adequado para uma banda que resistiu a muito e que criou este álbum com a muita música que lhes corre no sangue.


Maylene And The Sons Of Disaster - "III"
Formados pelo antigo vocalista da banda hardcore Underoath, esta banda de nome curioso apresenta uma sonoridade também bastante curiosa. A influência mais pesada está obviamente lá, mas nota-se aqui um cheiro dos grandes Pantera, dos injustiçados Corrosion Of Conformity, mas também do rock de inspiração sulista de bandas como Lynyrd Skynyrd ou ZZ Top. A combinação funciona sem falhas, resultando num álbum sólido, frontal, e extremamente empolgante. Muito recomendável para fãs de bom rock que procurem boa "driving-music"!


Pure Reason Revolution - "Amor Vincit Omnia"
Se há banda difícil de catalogar, são estes britânicos. Rock alterantivo, trip-rock, neo-qualquer-coisa. Até já lhe chamaram astral-folk. Pouco interessa, também. São bons, e isso basta. Depois do soberbo "The Dark Third", os Pure Reason Revolution dão sequência ao desbravar de novos territórios com este disco sobre o amor. Continuam a presentear-nos com a alternância entre as vozes de Chloë Alper e Jon Courtney e a criar ambientes fantásticos e tão diversos que podem agradar a fãs de esferas tão distantes como de Pink Floyd a Kraftwerk. O próprio mestre Rick Wakeman deu uma apreciação positiva ao trabalho desta banda. Um grande disco de uma banda que está a caminho de se tornar obrigatória.

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1 Comments:

Blogger Le ViC disse...

Há por aqui muito bom som e há também três ou quatro coisas que me despertaram o interesse, tenho de ir pesquisar...

10:44 da tarde  

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